Narrador salvou carreira de Djavan, expulsou Ayrton Senna da cabine e pegou elevador com Pelé: as incríveis histórias de Edson Mauro
- Pedro Bohnenberger

- 13 de mai.
- 6 min de leitura
Em entrevista ao Bohn de Papo, Edson Mauro relembra a infância em Maceió, conta como ajudou Djavan a conquistar espaço na música, detalha encontros com Ayrton Senna e Pelé e revela os bastidores de uma vida dedicada ao rádio.

Por pouco o Brasil não teria conhecido a voz suave e marcante de Djavan. A história, digna de roteiro de cinema, é contada por Edson Mauro, lendário narrador esportivo da Rádio Globo, em entrevista ao canal Papo Bohn, no segundo episódio do podcast Bohn de Papo. Segundo Edson, foi graças a um encontro inesperado e a uma madrugada generosa que o cantor teve sua grande chance no mercado fonográfico.
Edson e Djavan, conterrâneos de Maceió, se conheceram nos bailes e festas da capital alagoana. Djavan já era músico, se apresentava nesses eventos, e os dois trocavam conversa sobre futebol, já que ambos são torcedores do CSA. Anos depois, a história reservou um lugar especial para essa amizade.
Já morando no Rio e tentando oportunidades na capital, Djavan encontrou portas fechadas e não conseguiu emplacar seu trabalho musical. Como último recurso, procurou Edson Mauro na Rádio Globo, na expectativa de finalmente conseguir mostrar seu talento.
“Eu estava fazendo o Panorama Esportivo, que era de 23h à meia-noite. No intervalo comercial, a Verinha, telefonista, fala: ‘tem um amigo seu chamado Djavan’. ‘Pô, manda subir!’ Aí a gente, pô, maior abração e tudo mais, ele com o violão. E ele me conta: ‘cara, eu tô ferrado, tô querendo voltar pra Maceió. Já tô aqui há não sei quanto tempo, mas não consigo nada. Lembrei de você, pra tentar abrir uma porta com pessoal de gravadora, pra eu mostrar minhas músicas e tudo mais’. Aí eu falei: ‘Djavan, cara, eu tô aqui há um ano, praticamente, um ano e pouco. Não conheço ninguém’”, conta.
Mas o destino reservou boa sorte para Edson e Djavan. Nesse momento, entrou no estúdio Adelzon Alves, que apresentava um programa na rádio e era produtor de artistas consagrados como Clara Nunes e Beth Carvalho. Edson apresentou Djavan para Adelzon, que prometeu ouvir o trabalho do amigo depois do programa, às 4h da manhã. Depois de um jantar, Edson e Djavan retornaram e encontraram com Adelzon.
“Mandou o Djavan lá para dentro do estúdio. O Djavan sentou lá e começou a cantar. Aí abriu a boca, o Adelson olhou para mim... aí pela comunicação interna do estúdio, ele falava: ‘Essa é sua?’. Aí ele falou: ‘É minha’. ‘Canta outra’. Outra dele. ‘É sua?’. ‘É minha!’. Pô, umas 10 músicas, é sua, é minha, é sua, é minha... Aí o Adelson falou: ‘Cara, teu amigo canta pra caramba! Djavan, vai pra casa agora, dá uma descansada, e vem pra cá 16h que eu vou levar você no João Araújo, que era o diretor da Som Livre, pai do Cazuza’”.
João estava buscando novas vozes para trilhas das novelas da TV Globo. Nesse primeiro encontro, Djavan conseguiu emplacar seu trabalho artístico. A música escolhida para abrir as portas do sucesso foi Alegre Menina, que entrou na trilha da novela Gabriela.
Na contracapa de um de seus discos de grandes sucessos, Djavan registrou em agradecimento o nome de Edson Mauro, ao lado de outros responsáveis por sua guinada.
“Foi embora e continua a ser esse cantor maravilhoso, a figura maravilhosa. Ele tem um reconhecimento muito legal por tudo isso. Tanto que ele, quando fez um disco, tipo assim, os maiores sucessos, aquele apanhado que se faz das 10 maiores músicas que ele compôs e tudo mais, na contracapa ele colocou agradecimentos. ‘Agradeço a: o primeiro nome é o meu, Edson Mauro, com a cronologia toda. Edson Mauro, Adelzon Alves, João Araújo, fulano de tal...’”, conta.
O 'Bom de Bola' é perna de pau: casca de coco e a descoberta da vocação
Antes de brilhar nos microfones da Rádio Globo, Edson Mauro treinava narrações improvisadas usando uma casca de coco como microfone. Magrelo e preterido nos jogos de futebol de rua, encontrou sua vocação à beira dos campos de areia, narrando partidas entre amigos na praia, ainda criança.
“Eu tomava conta da roupa dos outros garotos que jogavam. Aí eu peguei uma vez uma casca de coco e comecei a narrar o jogo entre o time da minha rua e um outro time. Bola com Pedrinho, dá para Joãozinho, comecei a narrar. E os caras que estavam mais perto de mim falando: ‘Pô, legal, bom, não sei quê, blá blá blá’. Aí eu fui me entusiasmando e comecei a praticar isso. Fui fazendo um treinamento instintivo, para uma coisa que eu não percebia que teria futuro, mas eu estava fazendo. Por quê? Porque me agradava, eu gostava, dava gargalhada, as pessoas riam também na hora do gol e tudo mais”, relata.
A paixão pelo rádio veio cedo. Aos 13 anos, Edson participou de um concurso para locutor noticiarista na Rádio Progresso, em Maceió. Ganhou em primeiro lugar, mas não pôde ser contratado por ser menor de idade. Persistente, continuou treinando com o jornal do pai no banheiro de casa. Aos 15 anos, finalmente conseguiu uma vaga como estagiário na Rádio Difusora.
“Fui lá, gravei uma fita de notícias. O operador chamou o diretor, o diretor chamou outro diretor. No mesmo dia, me colocaram no ar e ainda me deram um nome artístico: Edson Mauro. ‘Edson Pereira de Melo não é radiofônico’, disseram. E assim nasceu Edson Mauro, no rádio”, conta entre risos.
A primeira oportunidade como narrador veio pouco depois, graças a Márcio Canuto, que era chefe da equipe da Difusora. Ele ouviu dizer que Edson narrava jogos na praia e o chamou para fazer o Torneio Início. A transmissão deu certo, ele ganhou a confiança da chefia e nunca mais parou. Dali, foi para a Rádio Gazeta, ao lado de Márcio Canuto, até chegar na Rádio Globo em 1971, aos 21 anos de idade. O resto é história.
O dia em que Edson Mauro expulsou Ayrton Senna da cabine de transmissão
Nem Edson Mauro escapou de viver uma situação inusitada com um futuro ídolo brasileiro. Durante uma cobertura internacional da Fórmula 1, escalado de última hora para substituir Galvão Bueno em uma transmissão da TV Globo, Edson teve que dividir uma cabine apertada com um piloto desconhecido... até então.
Naquela época, não havia as facilidades para identificar os pilotos, a ordem da corrida e os tempos de cada um. Tudo era feito a olho nu pelo narrador. Edson estava num local apertado com um visitante incômodo.
“Então você tinha que fazer a coisa no olho, você tinha que botar a cabeça fora da cabine, olhar o início da reta, identificar o piloto. E toda vez que entrava o pelotão inicial na reta, eu levava uma pressão pelas costas de um cara que estava vestido de piloto. Aí aquilo foi me incomodando. Teve uma hora que chegou o intervalo, entrou o comercial, eu falei: ‘Reginaldo, quem é esse cara? Ele está me pressionando muito aqui!’. Aí o Reginaldo pegou o cara, tirou e botou ele em outra cabine. Aí, quando terminou a corrida, eu mortaço, com sono, eu falei: ‘Reginaldo, cara, desculpe ter pedido a você para tirar o piloto aqui, seu amigo. Mas quem é mesmo ele?’. Ele falou: ‘É o Ayrton Senna, brasileiro que correu aqui na Fórmula V’”, contou.
Anos depois, já consagrado, Edson encontrou Senna numa sala VIP de aeroporto. Criou coragem para se apresentar e lembrar da história.
“Falei: ‘Ayrton, eu sou Edson Mauro, da Rádio Globo...’. Ele respondeu educadamente, mas não lembrava do episódio. Eu agradeci a Deus na hora por ele não lembrar que foi expulso por mim da cabine!”, conta, rindo.
Elevador com Pelé: camisa 10 ouvia a Rádio Globo
Se cruzar com Ayrton Senna foi marcante, imaginar dividir um elevador com Pelé é o tipo de coisa que parece mentira. Mas não para Edson Mauro, que viveu esse momento inesquecível durante a Copa do Mundo de 1982, na Espanha.
“Entrei no elevador, sozinho. No terceiro andar, ele parou e... entra o Pelé. Eu travo. Me apresento, digo que sou da Rádio Globo. Antes que eu termine, ele pergunta: ‘E seu Waldir? Cadê seu Waldir?’. Ele era fã do Waldir Amaral, o maior narrador esportivo daquela geração. Me pediu pra dar um abraço nele. Eu falei: ‘Meu Deus do céu, só o Pelé’. Então, ele era, era desse pé no chão todo, né? Eu não chamo isso nem de humildade, eu chamo isso de realidade. Ele era realista. Ele era o Rei Pelé, era o cara mais conhecido do planeta, mas que era de um realismo assim total com a figura que ele representava”, conta.
Edson Mauro, com sua voz firme, memória afiada e talento narrativo, é muito mais que um locutor esportivo. É um contador de histórias, um cronista do rádio, um guardião da memória afetiva de gerações de ouvintes brasileiros. De Djavan a Pelé, passando por Senna, sua trajetória mostra que, às vezes, um bom narrador também pode ser protagonista. Essas e outras histórias divertidas e inesquecíveis estão no segundo episódio do Bohn de Papo, nosso podcast do Papo Bohn. Ouça abaixo ou na sua plataforma favorita.




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