top of page
Buscar

‘Descobri que estou no espectro autista’: Tiago Amaral revela diagnóstico tardio que mudou sua vida

  • Foto do escritor: Pedro Bohnenberger
    Pedro Bohnenberger
  • 23 de mai.
  • 6 min de leitura

De vendedor de quitandas a fenômeno nas redes, mineiro transforma rotina simples em inspiração e humor — e revela diagnóstico de autismo que mudou sua forma de se ver no mundo.


Tiago Amaral, fundador da Taberna do Amaral. Fogo: Divulgação
Tiago Amaral, fundador da Taberna do Amaral. Fogo: Divulgação

Tiago Amaral ganhou notoriedade pelo humor afiado, os bordões divertidos e o sotaque mineiro. Mas, por trás das risadas e da espontaneidade, ele carregava dúvidas antigas sobre sua maneira de enxergar o mundo. A resposta chegou tardiamente, mas fez tudo ganhar sentido: além de uma ansiedade crônica, estava no espectro autista.


Tiago revelou o diagnóstico ao podcast Bohn de Papo, falando sobre o assunto com muita sensibilidade. Ele conta que, desde criança, percebia características diferentes de outros colegas, algumas manias e trejeitos cuja origem não compreendia.

“Descobri agora, no final do ano passado, que eu tô no transtorno do espectro autista. Eu sempre achei que eu era só sistemático e fresco com algumas coisas, mas não, agora as coisas fazem sentido. Com meus 17 anos, eu era muito agitado. Eu ficava o tempo todo batucando. E isso eu sempre tive problema em escola, todo lugar que entrava eles me expulsavam. Eu fui expulso de escola, eu fui expulso de coral, eu fui expulso de um monte de lugar, porque era insuportável ficar perto de mim”, conta.

Tiago já lidava, ao longo da vida, com um quadro de ansiedade e desenvolveu métodos para conseguir conviver com esse transtorno. Mas, com o passar do tempo e o nascimento da filha, que já chegou ao mundo com dois irmãos, ele precisou buscar ajuda. Fez um longo teste com uma neuropsicóloga, que o encaminhou a um psiquiatra. No laudo, em letras garrafais, a descrição: estava no espectro autista.


Hoje, aos 39 anos, após o diagnóstico, consegue buscar soluções e compreender, com leveza e empatia, suas próprias questões.


“Na terapia, eu tenho trabalhado essa questão de conseguir, de certa forma, o que era antes impossível. Eu era assim, uma pessoa muito rígida com algumas coisas, eu tenho meus métodos, né? Caneca, por exemplo, eu só pego com a mão direita. Camisa, eu só uso camisa de algodão. Tenho um problema seríssimo com tecido que não é algodão. Camisa de futebol, camisa social… Meia, eu calço a meia só do lado avesso, porque aquela costurinha me incomoda. Então eu estou tratando. É muito libertador quando você consegue nomear as coisas. E aí, quando você nomeia as coisas, você consegue encontrar soluções”, diz.

Ouça na íntegra a entrevista de Tiago Amaral ao podcast 'Bohn de Papo':


Quitandas, balaio, sol na cabeça e recomeço


Antes de virar figura pública na internet, Amaral era o padeiro da vizinhança. Literalmente. Começou vendendo quitandas pelas ruas de Divinópolis, em Minas Gerais, feitas por ele e pela mãe, depois de fechar uma fábrica e três lojas de confecção. Recomeçar foi um ato de sobrevivência – e de cuidado com a própria saúde mental.

“Foi a quitanda que me ajudou a curar de uma depressão”, revelou. “Eu fazia as coisas durante a manhã, embalava na hora do almoço e saía para a rua vender o café da tarde. Biscoito de queijo, bolo de cenoura, rosca, brioche de leite ninho… Nunca tive um cardápio. Sempre foi assim: o que eu tô a fim de fazer hoje, ou o que eu tenho aqui que eu posso fazer”, explica.

Quando abriu a Taberna, em 2016, chegou a trabalhar mais de 90 horas por semana, ainda que fosse constantemente chamado de “preguiçoso”. Ele retrucava: “Mais do que potencial, eu tenho preguiça.” A frase virou marca registrada e, atualmente, o próprio Tiago se classifica como um preguiçoso profissional.


Hoje, a Taberna está fechada, mas Tiago prometeu uma reforma para reabrir o negócio, que viralizou nas redes sociais pelo atendimento e horário de funcionamento inusitados.


Stevan Gaipo e o vídeo que mudou tudo


Entrevista de Stevan Gaipo com Amaral em 2020.
Entrevista de Stevan Gaipo com Amaral em 2020.

A vida de Tiago Amaral mudou de vez no dia 17 de março de 2020 — véspera do primeiro lockdown da pandemia — quando o humorista Stevan Gaipo postou um vídeo despretensioso na Taberna.

“Eu tratei ele como se fosse mais um. Se eu soubesse quem era o Stevan Gaipo, talvez eu tivesse me preparado um pouco mais, tivesse encenado alguma coisa. Mas foi muito natural, espontâneo.”

O vídeo viralizou.

“Esse vídeo bateu um milhão de visualizações muito rápido. As pessoas foram no YouTube me buscar. Ali surgiu o Amaral Amaral, a persona. Porque as pessoas achavam que aquilo era um personagem. Até hoje ele roda nos WhatsApps da vida. Vira e mexe alguém me manda mensagem: ‘Fulano lá do Japão, da Dinamarca’.”

Por causa do lockdown, o vídeo não rendeu ganhos financeiros, já que ninguém poderia visitar o estabelecimento. Porém, foi esse vídeo que o validou como produtor de conteúdo e, em meio ao fechamento de portas da pandemia, abriu um novo caminho: o de influenciador digital. É esse caminho que, hoje, sustenta a família que ele tanto ama: a esposa Júlia Carrilho e os três filhos (Tales, Leo e Nina).


Café com Ana Maria Braga: sonho de menino realizado


Amaral visita estúdio do Mais Você. Foto: TV Globo / Reprodução
Amaral visita estúdio do Mais Você. Foto: TV Globo / Reprodução

Se o vídeo com Gaipo o apresentou ao grande público, um momento em especial marcou sua trajetória pessoal: o convite para tomar café com Ana Maria Braga.

“Era meu sonho. E eu realmente tentei me inscrever para o Big Brother só para tomar café com a Ana Maria Braga. Eu queria entrar, ser eliminado na primeira semana e tomar café com ela”, brinca.

O convite veio após um corte de podcast em que ele revelou esse desejo. No Bohn de Papo, ele compartilhou memórias da infância com a mãe:


“A gente assistia à Ana Maria Braga para ver as receitas. Minha mãe anotava e depois a gente ia reproduzir. Se hoje eu sou padeiro, cozinheiro, eu devo isso a ela.”


Foram 18 minutos ao vivo, sem intervalo.


“Foi um negócio que me emocionou muito. A Ana é maravilhosa. Ela entra no estúdio, e todo mundo para para aplaudir.”


E sim, o café era de verdade — mas ele preferiu não comer. Aliás, nem deu tempo: o papo foi tão bom, que mal conseguiu experimentar as guloseimas do programa.


Mesmo realizando esse sonho, Amaral preferiu não usar o episódio para promoção pessoal. Para ele, aquele era um momento da pessoa física, que ficaria longe dos holofotes da pessoa jurídica.

“Eu nunca usei essa entrevista da Ana Maria Braga para me promover como o Amaral. Porque ali quem estava realizando um sonho era o menino Tiago. Não era o Amaral, era o Tiago. Ali era um sonho da pessoa física. Não era da pessoa jurídica. Então, aquele sonho era meu. E eu não tenho que compartilhar isso com o mundo. Eu não tenho que ficar usando entrevista, ficar postando TBT com a Ana Maria Braga”, pontua.

“Vôkerê”, “é nada”, “minha avó torrou café”: os bordões que viraram hits


Entre causos, quitandas e vídeos de comida, Amaral virou uma fábrica de bordões. Alguns nasceram do improviso, outros, de expressões antigas do vocabulário mineiro.


“Começa com o clássico ‘Sou do céu’. Aí tem o ‘É nada, é nada’. Depois vem o ‘Vou querer’, ‘Vou ter que querer’, ‘Pela mãe do guarda’.”


Um dos mais diferentes, talvez, seja “minha avó torrou café”. A explicação é toda dele:

“Quando se torrava café lá na roça, no fogão de lenha, aquilo esquentava muito. Se você saísse no vento, constipava. Então: ‘minha avó torrou café, não posso apanhar friagem não’. Ou seja, não vou poder não.”

Para os “nãos”, ele também inventou justificativas poéticas: “Chupei manga”, “passei para garupa”. Tudo sempre com um tom de brincadeira — e muito mineirês.


O que é a vida?


Para a pergunta abujamriana “o que é a vida?”, a resposta é direta e complexa, baseada numa vida simples:

“A vida é tudo aquilo que acontece enquanto a gente não está encenando. A vida é aquilo que acontece entre quatro paredes, quando não existem máscaras. A vida está no simples, no mais básico do básico do básico, que é estar perto de quem você gosta. E essas pessoas gostarem de você também. A vida acontece enquanto a gente não está fingindo ser alguma coisa”, explica seu ponto de vista.

Resolvo, então, provocar nosso convidado. Pergunto: cocê não quer largar tudo aí não e ir para São Paulo, ganhar um contrato milionário? A resposta não surpreende, mas destoa do mundo cão que busca sucesso financeiro a qualquer custo.


“Nossa, Deus me livre de um trem desses. Porque se fosse por conta de dinheiro, eu estava fazendo outra coisa. Não tem dinheiro no mundo que me tire esse sossego que eu conquistei: de estar com meus filhos, com a minha família, com a minha esposa, de tomar um cafezinho da tarde com a minha esposa, de levar meus meninos no futebol, de buscar meus meninos na escola, sabe? E de estar perto… eu moro do lado da casa do meu pai. Eu vejo meu pai todos os dias. Entendeu? Minha mãe… eu perdi minha mãe ano passado. E eu vivi com a minha mãe todos os dias. Então, assim, perder isso… não tem dinheiro no mundo que valha”, afirma.

Curtiu esse Papo Bohn? Não deixe de ouvir o podcast Bohn de Papo, disponível no Spotify, Apple Podcasts e Amazon Music.




 
 
 

Comentários


bottom of page